A proposta de substituir o vestibular das universidades federais do país pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ainda não é certa, mas o Governo Federal deixou claro por meio de declarações recentes do ministro da Educação, Fernando Haddad, que um dos objetivos é enfraquecer os cursinhos de pré-vestibular. A reforma não foi concretizada e as discussões são ainda hipotéticas, mas em contato com gestores de Educação e estudantes de pré-vestibular da capital, as opiniões se dividem.
As escolas se dizem preparadas para as mudanças e tranquilas sobre a metodologia de ensino atual, enquanto os alunos temem as consequências dessas mudanças. Conversamos com seis estudantes concluintes do Ensino Médio e alunos de cursos isolados, para saber o que eles pensam sobre o fim do vestibular.
Oriundos da rede privada, todos se mostraram contrários à proposta do Ministério da Educação e Cultura (MEC), e de forma geral argumentam que o ideal é reformar o ensino de base na rede pública para oferecer as mesmas condições de competição das vagas. Outro ponto unânime diz respeito a permanecer nos isolados mesmo com a adoção do Enem.
Para Kênnyo Santos, 16 anos e que vai tentar uma vaga em Medicina pela primeira vez, a medida deveria ser implantada de forma gradual. “Hoje o ensino é fragmentado e estudamos os conteúdos de forma fragmentada, embora já tenhamos exercícios que trabalhem as disciplinas de forma integrada”, explica. Ainda segundo ele, o Enem vai de encontro às regionalidades de cada local, podendo ocasionar uma perda dessa identidade nas provas.
“O Exame desconsidera a cultura, as tradições locais, que eram fatores que dificultavam a entrada de estudantes de outros estados na UFRN, por exemplo. Além disso, há disparidades na qualidade do ensino da rede pública e da privada, mas também entre os estados”. Kênnyo cita como exemplo os alunos de São Paulo, que em sua opinião se preparam de forma mais intensa. Jéssica Pimentel e Akemi Macedo, 16 e 17 anos respectivamente, acham que a mudança neste período do ano vai atrapalhar quem já se preparava pelo modelo do vestibular. “O Enem terá um nível mais baixo de exigência, e os alunos da rede privada já são prejudicados pela lei das cotas”, diz Akemy. “O certo é dar uma boa Educação a todos”.
Segundo Jéssica, mesmo se pudesse ter acesso às notas e soubesse que sua pontuação não seria suficiente para passar em Medicina, não mudaria de curso. “Estou disposta a enfrentar um ano de cursinho caso não passe dessa vez”.
Já Renata Pereira, 17, acredita que a diferença do ensino médio poderá interferir na formação profissional dentro da universidade. “Cada um é responsável pela sua própria formação, mas quem teve um bom ensino médio com certeza está mais bem preparado para ser um bom profissional”, opina.
Os alunos que se preparam para tentar uma vaga na universidade ainda este ano se dizem pegos de surpresa. “Por enquanto ainda estamos estudando os livros indicados pela UFRN, mas não sabemos se vão continuar”, diz André Garcia, 16. Ele acrescenta que o lado positivo do Enem é apenas a questão de permitir tentar uma vaga em mais de uma universidade pagando uma taxa única.
A estudante Ricena Brito, 16, declara que eles não estão sozinhos nestas opiniões. “Nossos amigos de turma pensam parecido conosco, a maioria se sente prejudicada pela mudança, embora já estudemos as disciplinas de forma contextualizada, e vamos tentar o Enem seja de forma integral ou parcial para ingresso nas universidades, como é hoje ”.
Professores opinam sobre substituiçãoO professor de Química e proprietário de curso isolado e escola de ensino médio Alexandre Pinto, admite que a medida pode prejudicar os cursinhos, mas somente os que ficaram “presos a “macetes” do passado: professores engraçadinhos que ensinam cantando musiquinhas. “Estes estarão seguramente fora do mercado, mas existem cursinhos e cursinhos. Tem muita gente boa, fazendo um excelente trabalho em nível de ensino médio e não apelando para a decoreba. Estes não devem se preocupar se tudo ocorrer conforme esta boa intenção inicial”, frisa.
Alexandre acredita também que a mudança vai prejudicar apenas os alunos viciados em “decorebas”, e beneficiar os bons estudantes. “Sem dúvida, um aluno que se prepara decorando conceitos e regrinhas e espera as famosas dicas de última hora e revisões de véspera vai ter muita dificuldade em se adaptar à nova realidade, ou seja, aprender a pensar, entender o conteúdo de verdade, sem aprendizado mecânico”, diz.
Segundo ele, o aprendizado de verdade sempre foi uma meta na carreira de educador e, por isso, trabalha o programa de química do ensino médio sem a utilização de fórmulas. “Priorizamos o real aprendizado dos conceitos e suas aplicações. A escola Ciências Aplicadas tem esta metodologia e, se a mudança no processo seletivo ocorrer conforme foi proposta, nossos alunos estarão preparados naturalmente”.
Opinião parecida tem Edvane Alves, coordenadora das turmas pré-vestibulares do colégio Cei. “Independente da decisão, estamos tranquilos, nossos alunos tem obtido ótimas notas no Enem nos últimos anos, inclusive primeiros lugares”, comenta.
Alexandre elogia a medida do MEC, mas diz que ainda existem muitas dúvidas no novo sistema, principalmente com relação à logística e à distribuição de vagas, e deveria haver mais debates. “Este sistema custou muitos anos de estudo antes de entrar em vigor nos países mais desenvolvidos e acho que tudo está ocorrendo rápido demais”.
Ele recorda que o vestibular da UFRN sofreu algumas alterações recentes e também polêmicas nos últimos anos, e mesmo assim os alunos mantiveram a média de aprovação dos anos anteriores. “O que pode e deve ser feito para melhorar o treinamento do aluno é a realização de simulados no novo formato para uma melhor adaptação e aproveitamento do tempo de prova”, completa.
Fonte:Tribuna do Norte